03 abril 2015

Manoel de Oliveira







Numa tarde encoberta a passear pelas margens do Douro, vejo ao longe um grande grupo de pessoas, câmaras de filmar, uma tenda branca e uns mergulhadores. Aproximo-me, olhando em volta, tento descobrir de que se trata. Até que vejo um livro, grande e antigo, a boiar nas águas revoltas. Capa pesada, ornada e bela. A equipa tenta resgatá-lo. As filmagens já terão certamente terminado naquele dia.


Ontem voltei a ver esse livro. Flutuava imponente no ecrã da minha televisão. Pertencia à curta-metragem “O Velho do Restelo”, de Manoel de Oliveira, misto de estilização e maquinação teatral e filosófica, e belo ainda assim. Não vi Manoel de Oliveira nesse dia (nem sabia que era um filme dele), quiçá estivesse abrigado na tenda ou já ocupado noutro lado, sempre enérgico e a trabalhar. Pois era efectivamente essa uma das imagens que tinha (tínhamos) dele, a vontade e determinação em nunca parar, em nunca ceder ao tempo, em continuar a fazer o que o apaixonava. Mesmo nem sempre compreendendo totalmente ou por vezes nem apreciando o (ainda pouco) que conhecia da sua obra, essa tenacidade e paixão eram exactamente o motivo principal porque o admirava. 


Fico a pensar no livro, sábio e resiliente sob a força das águas, à imagem do seu realizador. O realizador que afirmava “continuo a ser um aprendiz do cinema” e que “o cinema é um fantasma da realidade”. O realizador que queria filmar até morrer. Conseguiu-o. Manoel de Oliveira. Uma vida em pleno e um legado que será eterno.


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