06 março 2017

Fantas Express: do espírito de emancipação à melancolia em português


TUOS 




Há um cântico que nos percorre com a força visceral daquilo que é anterior ao próprio tempo e história. Espíritos espreitam da escuridão, espíritos que clamam e iludem, espíritos que pertencem à floresta, espíritos que comandam o passado, o presente e o futuro deste clã matriarcal. Senti Tuos de uma forma muito peculiar, senti as suas histórias a estontearem-me a mente, senti a sua melodia a encher-me o coração. 

Tuos, emotivo e extraordinário conto de emancipação feminina, no qual a brutalidade do concreto e a peculiaridade do místico se cruzam, no qual o sobrenatural e a realidade se esfumam de mãos dadas, de modo astuto, subtil e memorável! Tuos, prodigiosa fábula, indelével retrato! 



A FLORESTA DAS ALMAS PERDIDAS




No fim, sente-se incompletude. Olhamos para trás e, face a uma narrativa tão singular e a uma atmosfera inicial rica em suspense, é frustrante detectarmos esse potencial perdido. Também não ajudou o realizador definir o filme como pertencente ao género terror, não é de forma alguma o caso. 

Os diálogos incisivos, juntamente com o carismático trabalho de Daniela Love e Jorge Mota, e a evocativa fotografia a preto e branco são as forças maiores que contribuem quer para a acutilante beleza do filme, quer para o suspense incomodativo que o atravessa até ao arrasador twist. 
Contudo, a partir desse momento, a extravagância quebra-se, a dispersão instala-se, o feitiço desvirtua-se. Tal como as suas almas, também o filme se perdeu em si próprio.


03 março 2017

Fantas Express: da comédia nonsense israelita à mais aborrecida invasão alienígena de sempre!



OMG I’m a Robot! 



Robots. São frios, mecânicos, complexos automatizados guiados apenas por razão e lógica! E depois temos Danny, doce e hiper sensível, desconhecida maldição emocional que lhe atormenta a vida! E é dado assim o pontapé de saída para esta comédia descomprometida, sarcástica e ligeiramente non-sense! Diálogos divertidos, situações caricatas, one-liners algo parvas, lá esta, muito non-sense à mistura numa produção que, é importante dizer, tem por base questões políticas e morais: é impossível não associar de imediato a razão da criação dos robots com o próprio conflito israelo-palestiano! 



The Darkest Dawn



O que é que eu posso dizer sobre The Darkest Dawn? Serei directa: não gostei do filme. É aborrecido, é uma sucessão de situações cliché e maçadoras que não cativam nem originam outra reacção senão um revirar de olhos e um bocejo!


02 março 2017

Fantas Express: Vingança, Salvação, Reconquista



You’re Gonna Die Tonight 

Curta e mal sucedida incursão no género slasher, You’re Gonna Die Tonight é terrivelmente trapalhona e insípida, indigna de registo! 


Paranormal Drive 




Uma viagem assombrada às mãos de um espírito vingativo é o mote deste tenso e bem realizado mistério russo! Apesar de sabermos de início quem é a causadora de todos os sobressaltos e sustos, o modo como a narrativa se desenrola é cativante e inquietante, cumprindo exactamente o que promete! De facto, “Hell hath no fury like a woman scorned”, aposto que existe um equivalente russo e se não, eles que aprendam! Paranormal Drive, excitante e perturbador! 



El Ataud Blanco 




Até que ponto vai uma mãe para salvar os seus filhos, que limites está disposta a ultrapassar, que pecados está pronta a cometer? 
Assim se apresenta El Ataud Blanco, respondendo de forma descomprometida e desproporcionada e com laivos quer cómicos quer até um pouco foleiros à sua vincada premissa! 



A Ilha dos Cães 



Da Angola colonial à Angola imperialista, de prisão para rebeldes e revolucionários a último reduto de pescadores ameaçados pela exclusividade do “resort”, a ilha sempre se impôs como fortaleza dominada pelo misticismo, comandada pelas matilhas que tão notória e agressivamente a defendem. A Ilha dos Cães, surpreendente e capaz conto sobrenatural, foi especialmente hábil em aliar uma narrativa curiosa a uma atmosfera igualmente mística, resultando num filme cativante e satisfatório, que prende agradavelmente a atenção do espectador!


01 março 2017

Fantas Express: Land of Light e The Age of Shadows



Da infância estilhaçada à provação de um ideal maior… 



 LAND OF LIGHT 




Testemunho cru e avassalador, Land of Light paralisa-nos com o seu desarmante contraste entre inocência e maturidade, violência e brincadeiras, sonho e realidade, no confronto de uma infância devastada pela guerra na Síria. Essa guerra, como todas as outras, em que as crianças são o elo mais fraco, forçadas a sobreviver sem infância, forçadas a sobreviver apenas. Como quando assistimos ao momento em que, face à visão de uma família assassinada num ataque, a reacção imediata seja rebuscar pela casa por alimentos e objectos úteis. Ou ao desembaraço com que pegam numa arma. Ou quando, na cena final do documentário, ouvimos os seus argumentos sobre como dirigir esta narrativa. 
Por entre lágrimas e genuínos sorrisos, por entre tiros e canções, por entre destruição e esperança, Land of Light apresenta-se como um portentoso murro no estômago, arrastando-nos para uma realidade que não sendo desconhecida, obviamente, é muitas vezes comodamente esquecida por entre os míseros turbilhões do nosso plácido quotidiano. 



THE AGE OF SHADOWS 




Por entre sombras, uma figura ágil escapa-se da perseguição, de telhado em telhado, resistindo até não mais, até ao seu fim sacrificado. Por entre sombras, ultima-se uma revolução, pela independência, pela liberdade, por uma causa maior. Por entre sombras, os carrascos atarefam-se, é urgente silenciar tal ideal. Por entre sombras, criam-se alianças, desfazem-se acordos, sabotam-se conquistas, conquistam-se sucessos; quando a escuridão sufocante parecia total, mantém-se teimosamente viva a chama desse ideal maior. 

The Age of Shadows, para além de competente capítulo histórico, é acima de tudo exímio na construção de uma extraordinária atmosfera de suspense e ambiguidade que se prolonga por todos os seus 140 minutos. Traça uma aliciante e misteriosa narrativa, na qual questiona habilmente as noções de honra e lealdade das suas personagens, mantendo o espectador sempre em suspenso. Para além disso, apresenta-nos brilhantes interpretações de Kang-ho Song e Yoo Gong e deslumbra-nos com uma grandiosa cinematografia. 
Dono de uma intensidade vincada e arrebatadora, The Age of Shadows firma-se como um singular conto de resistência e integridade, na luta definidora por um ideal maior.