29 dezembro 2014

Joyeux Noël






O frio. A morte. A neve gélida e a lama viscosa. O medo. A doença. O desespero. O horror da trincheira no horror de uma guerra que ainda mal começara. O inimigo sempre à espreita; para existir guerra tem que existir um inimigo! E contudo, naquele Natal, a imagem do inimigo desvaneceu-se, os cânticos sobrevoaram as trincheiras e a terra de ninguém foi ocupada pela união, pela cumplicidade, pela esperança!

Joyeux Noël”, co-produção europeia, retrata de forma emocionante e sensível este episódio singular da História: a confraternização espontânea e não autorizada entre as tropas alemãs, francesas e britânicas em vários pontos de trincheira no Natal de 1914. E o filme é soberbo na apresentação dessa dualidade, desse contraste: comparemos a ferocidade das declamações feitas pelas crianças logo na cena inicial com a sinceridade do Merry Christmas, Frohe Weinachten e Joyeux Noël proferida pelos oficiais; ou a violência das baionetas e da artilharia com a generosidade com que os soldados trocaram comida, bebida, histórias e fotografias; ou a hipocrisia do sermão do bispo com a comunhão de todos os presentes naquela missa de Natal improvisada. Sempre magistralmente encenado, sempre brilhantemente representado. Diane Kruger, Daniel Brühl, Guillaume Canet, Benno Fürman, Gary Lewis, Alex Ferns…destacar alguém seria injusto… 

“Joyeux Noël” toca-nos ao coração de forma pungente e séria porque nos mostra e nos dá a esperança em acreditar que mesmo nos momentos mais negros e amargos existirá sempre uma réstia de humanidade que lutará por se impor.


23 dezembro 2014

Dracula Untold






As origens da mística e carismática figura. De Drácula filho do dragão a Drácula filha do Diabo, é este percurso sombrio que “Dracula Untold” pretende desvendar. 

Ora de verdadeiramente sombrio só possui a componente técnica, com uma fotografia eficaz em criar um ambiente gótico e pesado. Pelo contrário, a construção narrativa é algo débil, incapaz de fazer justiça ao peso desta personagem. E porquê, perguntarão? Em primeiro lugar, eu imaginaria o príncipe Vlad como uma personagem bem mais cruel e macabra e penso que nesta adaptação ele foi humanizado em demasia, perdendo parte da sua atracção. Eu até percebo a intenção por detrás desta escolha, que pretende partir do herói para o monstro, do sacrifício pela família e pela pátria para a maldição eterna. O problema, e aqui entra a segunda razão, é que esta humanização nem sequer é muito bem desenvolvida, sendo prejudicada quer pela sua esquemática rapidez quer pela inexistência de um sentido conflito moral. Ainda assim, terei que mencionar dois pontos positivos: o encontro na gruta entre Vlad e o Mestre Vampiro (Charles Dance ou, para os amigos, Tywin Grumpy Grampa Lannister) e a prestação de Luke Evans que, não sendo fantástica, também por culpa do já referido, é sem dúvida competente! 

Veredicto final? Entretenimento razoável, encabeçado pelo agradável Luke Evans, “Dracula Untold” peca apenas pela sua esquematização, que o impede de ser solidamente entusiasmante ou temível!


21 dezembro 2014

The Hunger Games: Mockingjay - Part One






Posso só falar desta primeira parte para o ano quando a metade final estrear? É que assim, que posso eu dizer? 

Repetitivo, Mockingjay – Part One é claramente prejudicado por esta divisão que lhe retira ritmo e fulgor. Quantas vezes é preciso mostrar (e sempre com o mesmo esquema) que Katniss está indecisa e receosa, que gosta do Peeta e está preocupada?! Quantas?! E por falar em Peeta, já referi que o moço é aborrecido? É que quer a ser salvo pela Katniss nos filmes anteriores, quer a actuar como rapaz propaganda do Capitólio neste, o único sentimento que me desperta é mesmo aborrecimento! E, já agora, espero que Cressida tenha maior destaque no próximo filme, porque ver a maravilhosa Natalie Dormer num papel tão passivo é definitivamente frustrante! 

Concluindo, esta primeira parte decaiu em qualidade e entretenimento, não se salvando nem com as prestações dos secundários de luxo Phylip Seymour Hoffman e Julianne Moore nem com a já tão falada prestação musical de Jennifer Lawrence! Para o ano voltamos à arena e espero que com chama!


18 dezembro 2014

The Strain


A crítica que se segue contém SPOILERS!








Confesso que era uma série que esperava com alguma ansiedade! Tinha gostado imenso do livro, capaz de construir uma narrativa original, tensa e empolgante a partir de um tema já tão imensamente badalado (falei nisso aqui), e ao volante da adaptação, como produtores e argumentistas, estariam nada mais nada menos que os seus autores! Ou seja, as minhas expectativas eram algo elevadas e, assim sendo, (aparentemente) justificadas.

E corri a ver o primeiro episódio. E…meh. Já lhe dediquei uma análise mas deixo um resumo: não me arrebatou como os primeiros capítulos que o inspiraram, porque mostrou em demasia, não criando nem dúvida nem verdadeiro suspense. Contudo, como o leitor é sempre um crítico mais aguerrido e como, apesar de tudo, até gostei da interpretação de David Bradley e do nível de gore apresentado, resolvi dar-lhe uma oportunidade!

E qual o veredicto final, perguntam vocês? DESILUSÃO! Sim, assim mesmo, em maiúsculas, maiúsculas de raiva e revolta! Como é que é possível? Como? Como é que partindo de material de qualidade e tendo como produtores/argumentistas os criadores da trilogia se faz isto? Não se enganem: estamos na presença de uma história sem um fio condutor lógico e coerente, de personagens construídas de forma oca (excepção feita a David Bradley e ao seu Abraham Setrakian e ainda a Richard Sammel e ao seu Thomas Eichorst), de uma narrativa ocupada por clichés e perdas de tempo quando o material de origem tem tanto por explorar…que desperdício!

Ora vejamos:

• O primeiro episódio, como já foi dito, falha claramente em criar a atmosfera adequada de tensão e mistério, ao preferir mostrar logo o Mestre e o ataque na morgue ao invés de nos apresentar todas aquelas questões e dúvidas sobre a “morte” do avião e o aspecto (exterior e interior) dos cadáveres que, no livro, sucessivamente nos aguçavam a curiosidade! E este foi o episódio realizado por Guillermo del Toro…e ao longo da série esse problema mantém-se…

• O momento escolhido para mostrar o eclipse foi simplesmente errado…fazia muito mais sentido como estava no livro, aliando a praticabilidade do momento com o seu misticismo e simbolismo!

• A relação entre Setrakian e Goodweather foi basicamente adulterada…no livro tornaram-se gradualmente mentor e aluno, formando-se até quase uma espécie de laço parental…enquanto na série senti sempre alguma desconfiança e por vezes animosidade de Goodweather para com o velho professor, o que prejudicou a evolução da história.

• Porque insistir na descrença sobre o que se está passar? Inicialmente até se percebe mas qual o sentido de ao fim de 8 episódios, depois de já terem sido atacados por vários strigois e os terem exterminado, depois de terem filmado um ataque de um strigoi e o seu posterior abate, depois de já terem assistido por inúmeras vezes às consequências da transformação em strigoi e assim confirmado as explicações de Setrakian sobre a praga, ainda acharem que uma cura é possível! Pior ainda, continuarem a receber as explicações do professor com uma mistura perfeitamente irritante de cepticismo e arrogância!

• Por falar em arranjar uma cura, e tendo em conta que a transformação em strigoi sempre foi retratada como um mecanismo de infecção vírica, a sério que dois epidemiologistas de referência tentaram salvar alguém arrancando meramente o, convenientemente único, (naquele momento) parasita do corpo do hospedeiro, e já passado um tempo considerável após o momento de infecção?

• Um flagrante exemplo de clichés e perda de tempo: a sério que passámos um episódio inteiro ( “Creatures of the Night”) encurralados num sítio vulnerável, a discutir sobre tópicos já explicados, à espera que mais e mais strigois chegassem, para que nos últimos 10 minutos arranjassem uma solução extremamente fácil para sair dali? Não, a sério, é que não é só mais um cliché, como foi retratado de modo simplesmente estúpido! Quer dizer, um dos strigoi quebra uma larga porção de vidro da porta, ele e os outros têm mais que tempo suficiente para entrar em força…e contudo, esse primeiro espera convenientemente no exterior até ser exterminado por uma lâmpada de UV-C, enquanto os outros não fazem o menor esforço para entrar!!!

• Tenho muito mal a dizer sobre a maioria das personagens mas a Dutch Velders é certamente a pior! Por que raio introduziram na história esta hacker duvidosa (com pretensões falhadas de Salander) para…wait for it…”deitar abaixo” a Internet? Porquê? Como? A sua relevância confirmou-se como não existente, pura e simplesmente! Devia ter sido logo sugada…

• As personagens de Ephraim Goodweather e Nora Martinez também deixaram muito a desejar. Corey Stoll ainda parecia promissor no primeiro episódio mas logo descarrilou para uma personagem aborrecida e incapaz de transmitir o seu desespero, para além de que a sua atitude para com Setrakian me irritou solenemente! Por sua vez, Mia Maestro foi simplesmente insípida ao longo de toda a série e a sua interpretação desvirtuou totalmente a personagem forte e pragmática do livro.

• Outro exemplo de péssima construção da narrativa: a transformação da Kelly Goodweather. Não teria sido bem mais emocionante mostrar esse processo só depois de ela aparecer a Zack e Eph? Assim assistimos à sua transformação, ficámos 2 ou 3 episódios sem saber mais nada e depois, bum, zero suspense e lá esta ela versão strigoi a ameaçar os seus “loved ones”?

• E ainda outro exemplo de desaproveitamento: o exército de strigois foi apresentado de estrondo mas depois foi simplesmente abandonado…mais valia terem-nos só mostrado num dos episódios finais…

• E chego à desilusão maior: o Mestre. A sua entrada em cena, o seu aspecto físico, o seu papel na evolução da história…tudo soube a pouco! Já me queixei que a sua apresentação foi um pouco anti-climática. Para piorar a situação, o Mestre é muito menos tenebroso que o descrito no livro: a parecença com o Mestre da série Buffy não lhe é favorável, tornando-o até mais ridículo que ameaçador. E, por último, senti que, ao invés de participar activamente na narrativa, foi a modos que encaixado quando desse jeito.

Enfim… Depois desta imensa lista, parece impossível descortinar algum ponto positivo no meio desta salgalhada! Contudo, tenho que deixar um elogio às prestações de David Bradley e Richard Sammel, que compuseram excelentes e cativantes personagens, e ainda à caracterização dos strigoi.


Concluindo, mesmo com a ressalva anterior, assistir a “The Strain” acabou por ser penoso. Ver o seu potencial desperdiçado episódio após episódio foi sem dúvida desmotivador e frustrante!


15 dezembro 2014

(As) Simetrias [16]


[Spoilers para a série The Strain]





Antes de publicar a minha crítica à série, relembro um dos raros momentos em que The Strain brilhou...falo de duas cenas distintas de transformação, no episódio "Gone Smooth":




Da revelação...




À ocultação...


O que acharam?


12 dezembro 2014

Nosferatu, eine Symphonie des Grauens






Mãos esquálidas. Dedos longos e afiados. Face delicada e tenebrosa. Mente e corpo obcecados na frágil figura feminina que espreita à janela. Sussurros, lendas e histórias, mortes misteriosas, pistas escritas a luz e sangue. Ninguém se atreve a dizer o seu nome. Nosferatu...





Inegável pérola do expressionismo alemão, "Nosferatu, eine Symphonie des Grauens", revela, já quase 100 anos passados, um vigor e uma alma invejáveis, aliados à magnífica presença de Max Schreck, que o tornam sem dúvida um clássico indescritível do cinema de horror e do fantástico!


07 dezembro 2014

Momentos (XXIII)






"Do you believe there is a demimonde? 

A half world between what we know and what we fear?"


Penny Dreadful - Night Work

29 novembro 2014

Interstellar






Amor entre galáxias. Amor que desafia o espaço-tempo, amor que cria “wormholes”, amor que persiste e luta por entre a vastidão do universo (in)finito. 

Em “Interstellar”, o amor é a força motora. Uma viagem intergaláctica e multidimensional (literal e metaforicamente, acrescento) que, na sua luta por sobrevivência, se redime pelo amor. Pois se é verdade que a construção visual da sua premissa é hipnoticamente exímia, pois se as questões e hipóteses científicas que levanta nos intrigam e estimulam, não há dúvidas que é a componente emocional da sua narrativa que notoriamente nos prende ao ecrã. Se a visão do Gargantua ou a passagem pelo wormhole nos fascinam, são o desespero e a perseverança de Cooper que verdadeiramente nos comovem. As suas lágrimas são tanto ou mais impressionantes que os hercúleos tsunamis do planeta aquoso. E isso diz-me muito. Não com tanta elegância ou eloquência como outros o poderão fazer, mas nem por isso com menos significado ou sentimento.


22 novembro 2014

Nuit et Brouillard





É um murro no estômago que como que nos drena todo e qualquer sentimento de esperança, de felicidade. Que nos rouba algo de nós para que nunca esqueçamos o que vimos. De que outra forma podemos reagir a tal sucessão de horror e monstruosidade?

“Nuit et Brouillard” foi um dos primeiros projectos a lidar abertamente com a realidade do Holocausto. É de forma crua e direi “descomplexada” que a retrata, intercalando de forma extremamente perturbadora a quietude do agora (1955) com o horror vivido nos campos de concentração. Um horror indescritível, inumano, ditado pela violência física e psicológica, pela perda de dignidade e pela perda da própria identidade. São os cadáveres emaciados, a longa extensão de cabelos femininos, os corpos esqueléticos. São os olhos abertos na morte, os objectos e roupas dos prisioneiros, os ossos e tecidos carbonizados. É um horror que nos persegue pela sua magnitude e calculismo, atormentando-nos não só com a perenidade das suas imagens mas também com a inevitabilidade das questões “Como foi possível que esta abominação tenha acontecido, como foi possível construir e ter posto em marcha esta incansavelmente eficaz máquina de morte?”.

Indiscutivelmente gráfico e chocante, o documentário de Resnais não se esconde do seu objectivo nem lamenta a sua frontalidade. Porque o seu efeito não nos deve nunca abandonar para que a memória deste horror nunca se desvaneça na “noite e no nevoeiro”. 


“Il y a nous qui regardons sincèrement ces ruines comme si le vieux montre concentrationnaire était mort sous les décombres, qui feignons de reprendre espoir devant cette image qui s’éloigne, comme si on guérissait de la peste concentrationnaire, nous qui feignons de croire que tout cela est d’un seul temps et d’un seul pays, et qui ne pensons pas à regarder autour de nous et qui n’entendons pas qu’on crie sans fin.” 

Excerto do texto de Jean Cayrol, narrado por Michel Bouquet no filme 
 (retirado de: http://www.cineclubdecaen.com/realisat/resnais/nuitetbrouillard.htm)


19 novembro 2014

Bobby







Intenção admirável que infelizmente não se concretiza num projecto sólido ou verdadeiramente emocionante.

Dia: 4 de Junho de 1968. Local: Ambassador Hotel, onde Robert F. Kennedy discursará para a campanha presidencial. Objectivo: ao longo das horas que antecedem o seu assassinato, mostrar como os ideais de Kennedy marcaram e influenciaram a vida de várias personagens. O problema é que estas pouco mais são que estereótipos da época, isto é, reconhecemos as suas causas/lutas mas no fundo não somos capazes de estabelecer uma nítida relação emocional com elas, excepção talvez para as personagens de Sharon Stone e de Anthony Hopkins. Para além disso, nem sempre é evidente o tal impacto de RFK nas suas vidas: que dizer, por exemplo, do casal interpretado por Demi Moore e Emilio Estevez? Ou seja, para mim, este formato narrativo não funcionou, não só pelo excesso de personagens mas principalmente pela incapacidade de estas demonstrarem o efeito da “mística” de Kennedy, digamos assim.

É que ela, essa “mística”, até está presente, mas não através destas personagens: antes pela voz do próprio Kennedy, na incorporação, ao longo do filme, de alguns dos seus discursos e declarações mais significativos e inspiradores. Sentimo-nos, desta forma, em contagem decrescente. E quando o momento chega, estamos realmente perante a melhor sequência do filme. Emotiva, contundente, demolidora. Neste caso, não apenas pela inclusão perfeita do discurso de RFK face ao assassinato de Martin Luther King, mas porque finalmente já nos é permitido sentir a dor e o desespero das personagens face ao sucedido!

Desta forma, e apesar do seu fulgor final, “Bobby” falha claramente no seu cerne: o de nos conduzir, através (e unicamente) das acções desta amálgama de personagens, aos sentimentos de esperança e mudança que Bobby Kennedy inspirava nesses finais conturbados dos sixties.


"Surely, we can learn, at least, to look at those around us 
as fellow men, and surely we can begin to work 
a little harder to bind up the wounds among us 
and to become in our own hearts brothers 
and countrymen once again."

excerto final do discurso "The Mindless Menace of Violence", 
proferido por Robert Kennedy a 5 de Junho de 1968



13 novembro 2014

The Third Man






Nunca me irei esquecer da sombra altiva e cruel de Harry Limes. Nem das suas mãos em súplica através das grades da sarjeta. Também nunca me irei esquecer da sublime composição musical de Anton Karas, tensão em crescendo. Nem da Viena sombria e misteriosa e dividida. Liberdade ou justiça, amor ou honra?

Notável noir, "The Third Man" é um intrigante e irresistível jogo de gato e rato que tem no magnífico Orson Welles a sua peça maior. Para além das cenas já referidas, como é possível ficar indiferente àquele arrepiante discurso na roda gigante, tão compassado e ameaçador?

Destaco ainda a excelente interpretação de Joseph Cotten, agitador (in)consciente de toda a narrativa, e a hábil realização de Carol Reed, que constrói, de modo subtil e magnético, o ambiente de tensão e mistério que nos envolve ao longo do filme!






"The old limelight. The fall of the curtain. 
Oh, Holly, you and I aren't heroes. 
The world doesn't make any heroes outside of your stories."


04 novembro 2014

Gone Girl






Ela vira-se para ele, rosto perfeito e indecifrável, olhar fixo e impassível, prolongado com a promessa do inatingível. 

“What are you thinking? What are you feeling? 
What have we done to each other?”

“Gone Girl”, o livro, dissecou, de forma magistral e contundente, a temível possibilidade de não conhecermos realmente quem está ao nosso lado, a pessoa que consideramos a nossa “alma gémea”, numa estonteante e arrepiante viagem pela fragilidade e bestialidade das relações humanas, desde a questão “Amor: compromisso ou desafio?” à leviandade da sociedade e media actuais. 

“Gone Girl”, o filme, é a certeza de que a perfeição existe. Mais que um fiel discípulo, é uma vibrante e crua adaptação, construindo de modo avassalador o ambiente de incerteza e tensão da obra-mãe. Porque é em constante parte incerta que o filme nos coloca, duvidando e questionando: o que aconteceu, quem é bom e quem é mau, o que raio aconteceu mesmo, existem sequer bons ou maus nesta história? Não tinha a certeza se iria conseguir sentir tudo isto, uma vez que já tinha lido o livro, mas Mr.Fincher, senhor thriller, superou, se tal é possível, as minhas expectativas! 


“She may be the mirror of my dreams
The smile reflected in a stream
She may not be what she may seem inside her shell” 
(“She”, de Elvis Costello)


Ela. Incrível Amy. Amy Elliot Dunne. Perfeita. Arrepiante e soberba Rosamund Pike! Que assombro de interpretação, vertiginosa! Como é possível seduzir-nos e assustar-nos com apenas o seu olhar, direi até com o mesmo olhar, de dócil arrebatamento a determinação gélida? Ainda me sinto apaixonada, oops, digo, atordoada! Personagem dentro de personagem, máscara dentro de máscara, desde o beijo sob a nuvem de açúcar ao beijo sob a chuva de sangue, tudo é hipnotizante perfeição! 




Por sua vez, o ar “bronco” (perdoem-me os fãs e ele também, mas só tenho gostado de o ver como realizador) de Ben Affleck é de facto uma mais-valia na sua composição de Nick Dunne!

“Gone Girl” afirma-se como um magnífico e sufocante thriller. O trabalho de Fincher é irrepreensível e belo, tanto narrativa como visualmente, e aliado, mais uma vez, à magnética banda sonora de Trent Reznor e Atticus Ross, oferece-nos um filme verdadeiramente excepcional, que a visceralidade de Rosamund Pink eleva à condição de transcendência!


"I don´t have anything else to add. 
I just wanted to make sure I had the last word. 
I think I've earned that."



11 outubro 2014

The Boy In The Striped Pajamas






Uma história contada de modo simples, quase linear, porque vista e experienciada pelo olhar de uma criança. Assim, tudo nos é transmitido com um misto de ingenuidade, inocência, incompreensão. Penso que é nesta perspectiva que o filme se destaca, pelo facto da sua (aparente) simplicidade esconder uma reflexão e uma dor que tanto carregam inevitabilidade como uma profunda tristeza, face a tamanho horror. Que não é visto, efectivamente, até ao final, mas sentido ao longo de todo o filme, por meias palavras e meias verdades, por propaganda e mentiras, por omissões e silêncios.





26 setembro 2014

Os Maias






“A casa que os Maias vieram a habitar no Outuno de 1875 era conhecida…como o Ramalhete.” 

A afirmação ecoa, solene e despojada, na tela como nas páginas, dando início à encenação. Memórias, figurinos, retratos e velhos móveis, artefactos e manuscritos, comungando, nesse harmonioso e peculiar genérico, com as fotografias dos actores e com o próprio guião. 
Está riscado, está escrevinhado, é (quase) cópia das palavras de Eça. Não é, contudo, uma mera transposição, aborrecida e linear. Longe disso, afirma-se como uma singular e vívida experiência, uma que é extraordinariamente capaz de se apropriar da obra sem lhe retirar espírito ou fibra! 





Em tom eternamente mordaz, o filme contrabalança de modo arrebatador a forte crítica moral e social com o turbilhão emocional do romance entre Carlos Eduardo e Maria Eduarda. Desde o “chique a valer” Dâmaso ao obtuso Gouvarinho, desde o saudoso Alencar ao incompreendido Cruges, desde o fleumático Craft e tantos outros até ao “antepassado bonacheirão” Afonso, todos compõem exemplarmente o âmago deste “chiqueiro” à beira-mar plantado, num retrato que tanto tem de cómico como de miserável! Como que a reforçar esta caracterização, a decisão de usar cenários falsos, lugares passados pintados a óleo, ainda que tenha por trás razões económicas, acrescenta-lhe um simbolismo que eu considero delicioso! Que pitoresco, que ilusão esta que salienta o triste anacronismo de Portugal, que belo e contudo desolador contraste entre as personagens e o ambiente que as rodeia…este pode ter mudado mas o chiqueiro mantém-se! 
Assim, como diria o Ega, “preciso de um banho por dentro!” E oh, esplêndido Ega, este Ega que parece ter saltado directamente da pena de Eça para o ecrã! Soberbo Pedro Inês, sarcástico, intenso, rebelde, um assombro! 





Do mundano ao amor! “Sabe perfeitamente que a adoro!”. Ah, doce e insaciável amor, voraz e cortês amor! Talvez por isso as cenas até à declaração de Carlos sejam filmadas com uma sensibilidade pungente e delicada, dois amantes inconfessos e castos. Por outro lado, o momento da confissão de Maria Eduarda reveste-se de um despojo emocional tumultuoso e até revigorante! 
E, no entanto, o brasão dos Maias, veludo sangue, sangue de paixão, sangue de dor, sangue de tragédia, não deixa de tombar, irreversivelmente, nessa noite sem luar nem perdão! Dois amantes confessos e ávidos, um, apenas consciente do amargo pecado. “Como é possível que…?”. Já o tinha questionado Ega, em mais um momento de notável expressão. Como, brada agora Carlos, incrédulo e revoltado? Graciano Dias é assim sublime neste acto em desgraça, corpo e alma dilacerados de ardor e mágoa! Por sua vez, e até estranhamente, a personagem de Maria Eduarda é a mais quieta do trio principal, ainda que Maria Flor consiga o seu momento: uma desoladora prostração ao som de La Traviata! 





“Meu caro, a vida é engano e desilusão!”. 

E oh, que belo engano, que bela ilusão nos oferece João Botelho! Um excelente trabalho de adaptação e realização, criador desta apaixonante e envolvente “ópera” trágico-cómica que, não só homenageia, como capta de forma crua e magnética a essência do romance de Eça! Bravo!



Imagens retiradas de: http://www.ardefilmes.org/osmaias/


16 setembro 2014

Lucy







O timbre profundo e solene de Morgan Freeman tem tanto de calmante como de convincente. “Só usamos 10% do nosso cérebro. O que aconteceria se conseguíssemos desbloquear as áreas esquecidas?”. Porque não? A questão premente não tem a ver com a falsidade da premissa (estamos no terreno da ficção científica, há margem de manobra!) mas sim com o seu aproveitamento enquanto motor do filme! E que posso eu dizer quanto a isso? Bem, parece-me que Besson só utilizou uns 65% das suas capacidades… 

O filme até começa com garra: as sequências que vão desde o aprisionamento de Lucy até à sua transformação e vingança são sem dúvida vibrantes e entusiásticas! Scarlett Johansson assume firmemente essa postura de “common girl turned super woman!”, se tal se pode dizer! No entanto, a partir desse momento, os seus poderes sobre-humanos são apenas um artifício para conduzir o filme numa sucessão previsível de clichés, tiroteios e confrontos finais…Ora bem, não se pedia nenhuma dissertação (que o filme nem joga nesse campeonato) mas custava muito ter-se focado mais no dilema entre as potencialidades e os riscos de Lucy (assim à semelhança da caixa de Pandora), por exemplo, do que nos oferecer o desenvolvimento medíocre que já vimos tantas vezes? Nem vou falar do final, até porque neste momento nem sei se gostei ou desgostei, mas por um lado acho que, mais uma vez, foi uma conclusão fácil…






Em suma, “Lucy” assume-se como um entretenimento (demasiado) descomprometido, ainda que agradável, deixando dessa forma um certo amargo de boca pelo desaproveitamento das suas potencialidades!


20 julho 2014

The Strain (2014): Night Zero



“O mal seguia-o sempre de perto.”



A seguinte crítica contém spoilers!!!





“A Estirpe”, primeiro da trilogia escrita por Guillermo del Toro e Chuck Hogan, foi para mim uma leitura absolutamente assombrosa! Uma história magistralmente contada e desenvolvida sob um ponto de vista surpreendente e inovador (Vampiros descritos como uma infecção vírica de proporções apocalípticas? Contem comigo!), imersa numa atmosfera quase sufocante de tensão, gore e suspense! Escusado será dizer que devorei o livro num piscar de olhos, sedenta por mais! Por isso, quando soube da adaptação ao pequeno ecrã, fiquei extremamente curiosa e ansiosa por conhecer o resultado final. E ora bem, o que é que eu posso dizer sobre o piloto, “Night Zero”?

Mixed feelings, mixed feelings everywhere! E começo já pelos pontos negativos, para não deixar dúvidas! O primeiro é gritante e corrói logo a tensão e sobressalto permanentes que o espectador deveria sentir: não precisam de mostrar logo tudo, que raio! Não percebi porque mostraram logo o Mestre no avião, ou o ataque do Mestre ao controlador aéreo, ou o ataque dos recém-infectados na morgue! Não poderiam construir um pouco mais de dúvida e especulação em redor do que se passou naquele avião ao invés de nos espetarem logo na cara, sim, são vampiros?! O segundo ponto está intimamente relacionado com o anterior: devia ter sido dado mais enfâse à análise do avião e dos cadáveres, às diversas anomalias que um e os outros apresentavam. Eu percebo que o livro é o livro e a série é a série, ou seja, nem tudo pode ser apresentado como foi descrito, mas esse acumular de inconsistências e questões é tão brilhantemente desenvolvido no livro, contribuindo para o seu suspense, que foi uma pena ver a forma atabalhoada como essa parte foi mostrada neste episódio! Até digo mais, a cena em que a menina regressa a casa do pai provocaria mil vezes mais impacto e incredulidade se todos esses aspectos que referi ainda não tivessem sido mostrados! E quando é o próprio Guillermo del Toro a realizar este episódio, ainda fico mais surpreendida por estas opções...






Mas nem tudo foi mau, nada disso! A primeira impressão dos protagonistas foi positiva, Corey Stoll como Ephraim Goodweather mostrou mais carisma do que eu esperava e também gostei da interpretação de David Bradley como Abraham Setrakian (mesmo com os Red Wedding feelings…não, estou a brincar). E apesar das deficiências apontadas a nível da construção do episódio, ainda se conseguiu sentir tensão e mistério, principalmente na inspecção ao avião e na tal cena da menina com o pai! E pressinto um favorável nível de gore, por isso, vamos em frente!


Concluindo, não foi um episódio piloto assombroso, que nos cativa de imediato. Obviamente que conhecendo o material de origem, as comparações são inevitáveis e o apontar das falhas é também mais fácil, provavelmente! Contudo, visto que este episódio também demonstrou o seu ar de graça, estou disposta a dar uma oportunidade à série, esperando que esta consiga de facto transmitir o espírito do livro e me faça, tal como ele, ficar sedenta por mais!


08 junho 2014

X-Men: Days of Future Past



Ora bem, aviso já que nunca li os comics e o que sei do universo X-Men é um misto de cultura geral (pode chamar-se assim?), visualização dos outros filmes e coisas que fui pesquisando por essa Internet fora. Por isso, esta crítica não vai abordar a fidelidade à obra original e afins, simplesmente porque não sou capaz de a avaliar...






Posto isto, o que me seduziu no “X-Men: First Class” foi a densidade emocional que imprimiram às personagens (por vezes coisa rara neste mundo das adaptações), a profundidade da relação entre Charles Xavier/Professor X e Erik Lehnsherr/Magneto e a qualidade do argumento. Sem sombra de dúvida, e de forma apaixonante, “X-Men: Days of Future Past” mantem essa estratégia de sucesso, declarando-se como um revigorante, invulgar e entusiasmante blockbuster! 
Em termos de argumento, temos uma história tanto intrigante como sólida, mesmo envolvendo o complicado tema das viagens no tempo. A sua resolução deixou-me satisfeita, porque me pareceu seguir uma progressão lógica, pelo menos de imediato; só fiquei com algumas questões sobre como esta interferência alterará o futuro e que consequências terá, tendo em conta o que a trilogia anterior nos revelou.
A nível de interpretações, bem, Fassbender e McAvoy são simplesmente incríveis, incorporando nas suas personagens um carisma palpável: um Magneto copiosamente maquiavélico e um debilitado Professor X numa jornada de “auto-descoberta”, se assim o quisermos pôr. E, já agora, qualquer diálogo, confronto, interacção entre os dois é terrivelmente empolgante e hipnótica, sem exageros! Jennifer Lawrence, embora uns furos abaixo (excepção feita à cena na cabine telefónica) não desilude como Mystique. Peter Dinklage, de Lannister a vilão, é convincente, mas não tão temível como eu imaginei. Tive foi pena que o tempo de ecrã de McKellen/Stewart não tenha sido maior…E quão cool seria um confronto entre o Magneto do futuro e o do passado, tal como aquele a que tivemos direito com o Professor X? 





Por último, qualidade técnica irrepreensível e nota positiva para o factor “coolness” que se respira (e ao qual First Class já nos habituara), quer pela época dos seventies, quer pelo modo como muitas das sequências nos foram apresentadas! 
E assim, sem artifícios desnecessários, “X-Men: Days of Future Past” afirma-se como um notável blockbuster, de excitante e inteligente execução! 


E agora, seguem-se SPOILERS!!!

12 março 2014

Las Brujas de Zugarramurdi (Fantasporto 2014)






Dono de um invejável humor negro, desde logo patente nos créditos iniciais, "Las Brujas de Zugarramurdi" apresenta-nos uma mistura mirabolante de horror e comédia que nos mantém entusiasticamente entretidos ao longo das suas quase duas horas!
O sarcasmo e a ironia imperam nesta história repleta de um absurdo e inflamado sexismo, a coberto do tanto "assustador" quanto risível sobrenatural!
Hilariante e crítico, "Las Brujas de Zugarramurdi" assume-se como uma proposta irrecusável, segura de nos deixar afincadamente bem dispostos!


11 março 2014

The Eternal Return of Antonis Paraskevas (Fantasporto 2014)





Talvez um dos filmes que mais hesitante e dividida me deixou nos últimos tempos. Da desconhecida Grécia (para mim), chega o peculiar conto de um homem, outrora áureo apresentador de um talk-show matinal, que finge o seu desaparecimento de forma a capitalizar as audiências.

Isolado num hotel, a sua rotina é desoladora: alimenta-se de incontáveis pratos de esparguete; desbobina, de forma ausente, as características do hotel naquilo que deveria ser o relato da sua estadia; experimenta, vezes sem fim, e sem sucesso, a cozinha molecular; revisita o seu passado, assistindo em loop, aos DVDs com o seu best-off profissional. O seu único contacto com o exterior é igualmente tormentoso: a procura incessante de notícias sobre o seu suposto rapto. Tudo isto nos é mostrado uma e outra vez, com o protagonista, sempre de semblante carregado, a afundar-se progressivamente numa dúbia e depressiva condição.

"The Eternal Return of Antonis Paraskevas" constrói assim, de modo invulgar mas assertivo, uma dura crítica à sobre-exposição e manipulação mediática dos dias de hoje, não se alheando ainda da realidade económica do seu país. Ora quão sarcástica pode ser a sobreposição do estado mental do protagonista com as notícias relativas à intervenção do FMI em Portugal nos anos 80 e à entrada da Grécia no Euro?

Enquanto o filme manteve esta abordagem, apesar de algumas decisões definitivamente questionáveis ou estranhas, ainda me conseguiu manter interessada. Contudo, a sua porção final manifestou-se como precipitada e incongruente, abalando de forma significativa um filme que já carregava às costas uma estrutura deveras introspectiva e pausada e um tom por vezes pretensioso.


10 março 2014

Big Bad Wolves (Fantasporto 2014)






A introdução define o tom. Tenso, enigmático, desconfortável. Um sapatinho vermelho que clama por sangue. Quem são os lobos maus? Gritos, ossos quebrados, provocação. Tortura, desespero, vingança. "Maniacs are afraid of maniacs."

É com arrojada mestria que "Big Bad Wolves", notável e arrepiante thriller, consegue transtornar e desafiar o espectador, deixando-o em suspense até ao último momento! Habilmente construído e interpretado, misturando o registo slasher com pontuais toques de humor, é revigorante e incómodo no seu desenvolvimento, mordaz na sua ousadia, vibrante e inteligente!

Sem dúvida, uma das mais entusiasmantes e intensas experiências cinematográficas de 2013!


Shield of Straw (Fantasporto 2014)





Venderias a tua honra por um bilião de yens?

É esta a excitante questão que move o percurso de "Shield of Straw", inicialmente desenvolvido de forma acutilante e enérgica. No entanto, essa mesma questão torna-se ultimamente demasiado repetitiva e também longa, a partir do momento em que o filme não evolui para além de uma mera sucessão de similares eventos, sem transmitir verdadeira garra ou suspense.


09 março 2014

Love Me (Fantasporto 2014)





Um "desfado" de amor sob o gélido capricho de inevitáveis idiossincrasias de tradução e tormentosos demónios pessoais. 

Co-produção turco-ucraniana, "Love Me" revela-se surpreendentemente formoso e desesperado, possuidor de um delicado argumento, magnificamente explorado, e de impressionantes e agridoces interpretações! Num filme propositadamente parco em diálogos, é sublime a forma como os actores valorizaram a expressão corporal na composição das suas personagens!

Íntimo e virtuoso, "Love Me" distingue-se de forma audaz pelo seu tom não convencional, que não só lhe acrescenta espontaneidade e beleza, como, acima de tudo, identidade.

What Maisie Knew (Fantasporto 2014)







Uma história simples pode ser igualmente uma excelente história. Adaptando, com alguma liberdade, o romance homónimo de Henry James, "What Maisie Knew" encara os temas aí versados com garra, sensibilidade e franqueza. "What Maisie Knew" é exactamente isso: a perspectiva de Maisie face ao divórcio (conflituoso) dos pais e às consequências dessa decisão. É portanto um olhar que mistura inocência e confusão, tristeza e brincadeiras, mágoa, ultimamente maturidade. A pequena Onata Aprile é encantadora e extraordinariamente credível nessa composição, um regalo! Julianne Moore, descontrolada mãe, proporciona-nos o adequado constrangimento e perplexidade face à sua sistemática raiva e negligência!
Sólido, emotivo e directo, "What Maisie Knew" não deixa o seu espectador indiferente!


07 março 2014

Cold Comes The Night (Fantasporto 2014)






Uma forte premissa ultimamente mal explorada e a incapacidade de edificar uma tensão verdadeiramente palpável. Eis as fraquezas deste "Cold Comes The Night" que culminam numa conclusão algo precipitada e incongruente. Não sendo um mau filme, é certo que prometeu bem mais do que aquilo que ofereceu.

06 março 2014

Viral (Fantasporto 2014)





Como uma paródia à omnipresença das redes sociais, "Viral" é bem sucedido na sua tentativa de conjugar o sobrenatural com a fama efémera e veloz dos dias de hoje, à mera distância de um "gosto". No entanto, o recurso a um artifício tão banal e fácil como o usado na porção final arruinou, para mim, um conceito inicialmente promissor, conduzindo a um desfecho que me soube a desilusão.


Stalled (Fantasporto 2014)





Um empregado da manutenção. Os lavabos femininos. A festa de Natal do escritório. E uma horda de zombies esfomeados e talvez embriagados a encurralá-lo! É preciso mais?

Pelos vistos sim, que contra a minha previsão, "Stalled" não se revelou o fantástico filme para o qual o seu potencial apontava. Produção categoricamente low budget, filmada numa quinzena de dias (atenção, não é este o problema!), Stalled dispersa-se, falhando em criar a absorvente atmosfera de tensão e gore a que se propunha! Nada contra os momentos de confidência entre os protagonistas, mas não faz muito sentido que, numa altura, os zombies ataquem furiosamente como os raivosos que são e noutro esperem convenientemente para não interromper a conversa!

Inconsistências e quebra de ritmo à parte, despeço-me com os pontos positivos: zombie crowdsurfing, técnicas de defesa/ataque contra os zombies, zombie flashmob e, sim, adivinhem, zombies no geral! Aah...desmiolados preferidos!


Matei, Copil Miner (Fantasporto 2014)






Apreciei a beleza das paisagens campestres da Roménia. Quanto ao filme, saí sem lhe descobrir o rumo. Notaram-se as raízes documentais da realizadora, a câmara move-se de forma crua e imparcial. Fraquejou apenas, e ainda bem, na cena do velório, delicada e de extrema sensibilidade. Uma viagem contemplativa, num registo que me era desconhecido, mas que, infelizmente, apenas nos toca na alma de raspão.


05 março 2014

Kung-Fu Divas (Fantasporto 2014)







Se estivesse sempre em modo de cérebro desligado, talvez conseguisse suportar o filme! Não, nem assim! Foi demasiado estúpido, demasiado foleiro! O primeiro terço ainda tem alguma potencialidade cómica...mas quando os trunfos passam a ser cuecas a tombar no chão e super-poderes com cabelos à la Pantene ultrapasso o limite do non-sense e suspiro, a desesperar pelo tempo perdido!


Sparks (Fantasporto 2014)

Estilizado e inicialmente intrigante,"Sparks" afirma-se como uma história de super-heróis onde os valores tradicionais de amor,vingança,desespero e redenção imperam. Contudo,é pobremente trabalhada. Não sendo habilmente inovador e falhando em adensar o mistério a que se propôs,é com inevitável pesar que assistimos a uma trajectória de aborrecida desorientação e maquinal previsibillidade!

03 março 2014

Cheatin' (Fantasporto 2014)

Um curioso conto animado,de traços exagerados e disformes,sobre amor e traição! Singular experiência na sua forma e conteúdo,"Cheatin" seduz e intriga o espectador com a sua eficaz irreverência e sagaz originalidade!

Besos de Azucar (Fantasporto 2014)

Uma espécie de "Romeu e Julieta" pelas sujas e promíscuas ruas da Cidade do México. Não,não existe rosa,antes uma música,a tal que os uniu. Nacho e A Boneca. Aparentemente diferentes,contudo filhos do mesmo desleixo,da mesma violência! Ambos na idade das descobertas,encontram-se um ao outro por entre um turbilhão de negligência e abuso. "Besos de Azucar". Um comovente e puro conto de amor que confronta habilmente uma doce inocência infantil com uma abjecta aversão,teimosa e implacável contaminante!

01 março 2014

Vampire Academy (Fantasporto 2014)

Divertido,ligeiro,descomprometido e também pateta, "Vampire Academy" pega na mitologia e acrescenta-lhe uns pormenores aqui e acolá (que bem pecam pela falta de desenvolvimento),tudo isto enfrentando as agruras da adolescência e da vida no liceu! Sim,os efeitos especiais são sofríveis e algumas situações e diálogos acabam por ser ridículos,no entanto,o filme até consegue ser cativante no seu amadorismo e ineficiência! Não acho que seja material de abertura de um festival;é,contudo,entretenimento sincero e despreocupado que ainda nos oferece umas boas gargalhadas!

The Wizard of Oz





Poucos filmes conseguirão transparecer tal magia e encantamento como "The Wizard of Oz"! Mesmo à distância de tantas décadas, com toda a evolução da tecnologia subjacente,não é preciso um tornado para sermos vividamente transportados para as maravilhas de Oz! Seja pela doçura de Judy Garland,pelas traquinices dos Munckins,pelos desejos do Espantalho,do Homem de Lata e do Leão ou pela horrenda Bruxa Má do Oeste,nós acreditamos,nós vivemos todas as aventuras ao longo da fantástica estrada dos tijolos amarelos! É sem dúvida um clássico tão enternecedor quanto vibrante,que nos envolve esplendorosamente através dos valores do sonho,da amizade,da coragem e da determinação!                                   

     (Fantasporto 2014 - Fantas Classics)


28 fevereiro 2014

Momentos (XXII)







Connor: You need sortin' out, you do. 

Mia: So you keep sayin' 
But you're nothing to me, so why should I listen?




27 fevereiro 2014

Cinematograficamente Musicando (8)



Clint Eastwood

(Gorillaz - Gorillaz, 2001)





Bem, as referências cinematográficas não terminam no título da canção! Ouve-se um grito...é de alguém bom, mau ou vilão? Ou está a alertar-nos para o aviso que se segue, sobre uma madrugada de mortos-vivos? Protejam-se! Não querem arrastar-se, famintos, em morte cerebral!


25 fevereiro 2014

The World's End






Cinco amigos. Doze pubs. Um objectivo. E muitos problemas! Eis “The World’s End”,num resumo simplista! 

Ora, infelizmente, os problemas não se referem apenas aos desafios que este gang tem de enfrentar ao longo da sua épica e líquida aventura! Achei a história mal concretizada e dirigida: não me pareceu existir um equilíbrio consistente entre a “Golden Mile” e a invasão/dominação. Por outro lado, este capítulo final não possui nem o arrebatamento cómico de “Shaun of the Dead”, nem o seu tom sarcástico e corrosivo! Ainda assim, consegue alguns bons momentos de humor (a memória selectiva de Gary, a interacção entre o grupo, os possíveis nomes para bandas) e umas inspiradas e divertidas sequências de luta! 
“The World’s End” está longe de ser perfeito, pecando na sua ineficiência em conjugar de modo fluido a sua vertente de entretenimento com o desenvolvimento do lado mais sério da sua premissa. No entanto, ainda é capaz de nos arrancar umas boas gargalhadas e, mesmo não sendo plenamente satisfatório, pode bastar para alegrar um dia mais cinzento!


22 fevereiro 2014

American Hustle






Tão plástico como as perucas dos seus protagonistas, tão barato como os decotes das suas protagonistas, “American Hustle” é um engodo de pretensiosismo e falso estilo que rapidamente se desmorona face a um sofrível argumento e insignificantes interpretações. David O. Russel dirige um filme desinspirado e aborrecido, quer na construção da história, previsivelmente linear, quer no desenvolvimento das suas personagens, nas quais aparentemente só se investiu a nível da caracterização física. Lamentável.


12 fevereiro 2014

The Wolf of Wall Street







Deboche, deboche à velocidade da luz! “Cocaine and hockers!”, como brada a personagem de Matthew McConaughey, na sua breve mas verdadeiramente electrizante aparição. Sexo, drogas e especulação financeira! Bem-vindos, contemplem a louca, louca Wall Street, cortesia das memórias de Jordan Belfort! 





“The Wolf of Wall Street”, quinta colaboração entre Scorcese e DiCaprio, é uma trip (quase) sempre em alta e sem retorno, ao impressionante e sujo mundo da especulação financeira. Por entre uma montagem exuberante e inconstante, por entre extravagantes escolhas musicais, por entre uma linguagem agressiva e muitas vezes non-sense, por entre ousadas e até ridículas cenas de sexo, reconhecemos o génio e classe de Scorcese, que no âmago de tanta folia, arquitecta pois um retrato alucinante e ousado, mas nunca moralista, da ganância e corrupção humanas! E depois temos o senhor DiCaprio, prodigioso camaleão, incorporando de forma assombrosa a impetuosa mesquinhez, a apelativa excentricidade, a demolidora arrogância, o animado despotismo que a sua personagem adoptou como mantra! Uma composição de tal modo apaixonante que, mesmo sabendo a sua queda como inevitável e justa, é com fervor que por ele torcemos! Neste corrupio de excessos, destaco ainda o hilariante papel de Jonah Hill e a sedutora interpretação de Margot Robbie; o primeiro em excelente complemento cómico, a segunda, em presença fogosa e determinada! 





Sumptuoso, audaz e vertiginoso, “The Wolf of Wall Street” mantém-nos sequiosos das reviravoltas e esquemas deste lobo que nunca vestiu a pele de cordeiro, mas certamente nos arrebatou como um!