09 dezembro 2009

Blindness/Ensaio sobre a Cegueira


(Crítica feita na altura da estreia do filme, há um ano atrás)

Fui ver o filme de Fernando Meirelles depois de ter lido o livro de José Saramago, por isso as minhas expectativas eram bastante elevadas!

Após ler o livro, impunha-se uma pergunta: como passar para o ecrã toda a profundidade da obra? Como passar para o ecrã todas as reflexões e pensamentos das personagens, essas personagens sem nome, que experimentam um sofrimento físico e principalmente psicológico inimaginável e que terão de se redescobrir a si próprias, para sobreviveram num mundo de cegueira? As minhas expectativas não foram defraudadas. Meirelles adaptou o livro maravilhosamente, realizando um filme sublime e poderosíssimo! O filme, se bem que talvez de maneira diferente, uma vez que a interpretação de um livro é algo de subjectivo e livre, mexeu comigo tal como o livro, perturbou-me e foi incómodo, o que, posso afirmar, constitui um valente elogio! As passagens mais perturbadoras, como a atitude dos soldados e do “poder” para com os cegos, a podridão e sujidade que assolam o hospício e a tomada de poder dos cegos “maus” que culmina com a arrepiante cena de violação colectiva não deixam lugar para a indiferença! O horror daquela quarentena foi transposto com toda a sua força! Na minha opinião, essa primeira parte do filme é o seu ponto mais forte. A segunda parte, após a saída do hospício, talvez esteja um pouco mais desequilibrada, porque algumas passagens do livro foram eliminadas, mas o filme não perde com isso, porque o espírito da obra está totalmente presente. A opção de fotografia foi bem conseguida: a luz branca envolve-nos e conseguimos sentir a “cegueira branca” quando experienciamos os acontecimentos pela perspectiva dos cegos. Para além do excelente trabalho do realizador e do argumentista, é de salientar igualmente o trabalho dos actores, destacando Julianne Moore. Julianne Moore entra realmente na personagem e é a partir da sua expressividade que acreditamos no seu dilema interior, na sua luta: como ser a única mulher que vê num mundo em que todos estão cegos e não se sentir completamente isolada? Gostei igualmente da interpretação de Alice Braga, uma actriz desconhecida para mim até agora.

“Blindness” é uma belíssima adaptação do romance de Saramago, que consegue transmitir a metáfora descrita pelo autor: estamos muitas vezes cegos em relação ao mundo, apenas porque é mais fácil recusar ver o que acontece à nossa volta do que reagir.

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