Tecnicamente, Les Misérables entra em cena com uma mestria irrepreensível. Cenários, guarda-roupa e coreografias conjugam-se habilmente no intuito de seduzir o espectador. E conseguem-no. Pena é que não o cativem, que não o inflamem!
Um filme não pode viver apenas da forma, do deslumbre do olhar. Mesmo um musical. E de facto, não fosse pela entrega de Anne Hathway, pela paixão de Eddie Redmayne, pela dor de Samantha Barks ou pelo burlesco da dupla Helena Boham Carter/ Sacha Baron Cohen, e Les Misérables limitava-se a ser um mero desfilar de canções. No seu conjunto, falta-lhe alma! É algo desolador ver como os miseráveis, os da fome, os da miséria, os da injustiça, foram acossados pelo jugo do coro, sem uma concreta ou intensa voz. O contexto social e político da obra ficou dessa forma, se não esquecido, pelo menos bastante negligenciado, sob uma panóplia de números musicais que, a certa altura, se revelam penosamente longos. Não nego a existência de momentos extraordinários, dos quais destaco o “I Dreamed A Dream” de Hathaway ou o “Empty Chairs At Empty Tables” de Redmayne (e repito, estes dois são verdadeiramente portentosos!) mas penso que Tom Hooper tanto quis ser grandioso que acaba por pecar por um excesso de formalismo e pomposidade, esquecendo-se de desenvolver aceitavelmente quer a narrativa quer as personagens!
Assim, e apesar de algumas excelentes interpretações e sequências contagiantes, Les Misérables falha em transpor toda a carga emocional, histórica e social do épico que a pena de Victor Hugo tão arrebatadamente redigiu, não alcançando sequer a sumptuosidade a que se propôs.