31 janeiro 2013

Les Misèrables





Tecnicamente, Les Misérables entra em cena com uma mestria irrepreensível. Cenários, guarda-roupa e coreografias conjugam-se habilmente no intuito de seduzir o espectador. E conseguem-no. Pena é que não o cativem, que não o inflamem!

Um filme não pode viver apenas da forma, do deslumbre do olhar. Mesmo um musical. E de facto, não fosse pela entrega de Anne Hathway, pela paixão de Eddie Redmayne, pela dor de Samantha Barks ou pelo burlesco da dupla Helena Boham Carter/ Sacha Baron Cohen, e Les Misérables limitava-se a ser um mero desfilar de canções. No seu conjunto, falta-lhe alma! É algo desolador ver como os miseráveis, os da fome, os da miséria, os da injustiça, foram acossados pelo jugo do coro, sem uma concreta ou intensa voz. O contexto social e político da obra ficou dessa forma, se não esquecido, pelo menos bastante negligenciado, sob uma panóplia de números musicais que, a certa altura, se revelam penosamente longos. Não nego a existência de momentos extraordinários, dos quais destaco o “I Dreamed A Dream” de Hathaway ou o “Empty Chairs At Empty Tables” de Redmayne (e repito, estes dois são verdadeiramente portentosos!) mas penso que Tom Hooper tanto quis ser grandioso que acaba por pecar por um excesso de formalismo e pomposidade, esquecendo-se de desenvolver aceitavelmente quer a narrativa quer as personagens!

Assim, e apesar de algumas excelentes interpretações e sequências contagiantes, Les Misérables falha em transpor toda a carga emocional, histórica e social do épico que a pena de Victor Hugo tão arrebatadamente redigiu, não alcançando sequer a sumptuosidade a que se propôs.


28 janeiro 2013

The Impossible






Podia ter sido um mero dramalhão a explorar a tragédia que foi o tsunami de 2004, numa insuportável ou abjecta história “bigger than life”. Felizmente, não o é, nem sequer de tal se aproxima. 

“The Impossible” surge como um conto de sobrevivência e esperança, cru e inspirador. Que nunca se esquece da sua origem, “this is a true story”, espelhando uma sobriedade e uma humanidade tão necessárias, quanto sinceras. Qualidades essas, fruto não apenas do distinto e inventivo trabalho de Juan Antonio Bayona, mas também (principalmente, atrevo-mo) dos seus actores, magnífica e corajosa trindade: Naomi Watts, Ewan McGregor e Tom Holland. A agressividade com que a câmara trata Watts – veja-se a tumultuosa e pormenorizada cena em que é arrastada pela corrente ou, mais tarde, na sequência do hospital – é séria, quase obsessiva, mas nunca esquemática ou sem propósito, e Naomi Watts transmite na perfeição a dor e o desespero da sua personagem. Tom Holland, absoluta surpresa, de um prodigioso desempenho que faz sombra à sua tenra idade, revela uma candura, uma força e pragmatismo que nos impressionam do início ao fim. Pena é que McGregor não tenha tido o espaço suficiente para desenvolver a sua personagem, embora a sua “quebra” ao telefone seja, sem dúvida, um dos pontos altos do filme. 

Íntegro e consciente, “The Impossible” é sublime no modo como devasta o espectador, sem manipulações ou lágrimas fáceis, abraçando por completo a dimensão humana da história que nunca explora.