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Despedida, mágoa, separação, tristeza…são tempos deveras negros e dolorosos, estes que antecedem o último ano em Hogwarts. Mas Harry Potter não vai para Hogwarts. Nem Ron. Nem Hermione. Tudo está mudado. Dumbledore morreu. Voldemort prepara o seu reinado de terror. Há apenas uma esperança. Encontrar as Horcruxes e destruí-las. E assim destruir Voldemort. Mas quando a última esperança se afigura como desoladamente gargantuesca e inalcançável, um misto de desespero, perseverança e sacrifício instala-se. E é esse espírito que vemos em Harry e Ron, olhando determinados para o horizonte, para a jornada que se aproxima…e é esse olhar que vemos em Hermione quando, comovida, apaga as memórias dos seus pais para os proteger e se afasta do seu lar, num início de filme mais poderoso, tocante e revelador do que qualquer um dos seus antecessores!
“Harry Potter and The Deathly Hallows” restaurou quase completamente a minha fé na adaptação cinematográfica. Bastou a sombria introdução para perceber que finalmente uma abordagem mais adulta e complexa estava em curso: ao destacar o sacrifício de Hermione, quando no livro é apenas uma referência, Yates consegue amplificar o temível ambiente causado pela ameaça de Voldemort e, apesar disso, a maturidade e coragem que os três protagonistas tão inocentemente demonstram. Embora talvez o mais sonante, não foi, felizmente, um momento único. A cena (totalmente improvisada) de dança entre Harry e Hermione, ao som de Nick Cave, mostrou uma rara sensibilidade, uma deleitável prova da profunda amizade que os une, enquanto as as interacções entre os 3 protagonistas foram capazes de ilustrar tanto a lealdade, a amizade e o amor presentes como a desconfiança, as inseguranças e os confrontos que inevitavelmente iriam surgir ao longo desta relação.
A narrativa corre assim, fluida, dramática e terrífica, pontuada por breves momentos de humor (valha-nos Ron e os seus irmãos gémeos!) e conseguindo condensar, de modo quase perfeito, a extensa história que, com as suas diferentes mitologias, lendas, subtemas e personagens, dá vida ao hercúleo, complexo e fascinante sétimo volume, provavelmente o meu preferido! Contudo, e daí a minha hesitação inicial, sente-se uma alarmante incompletude em pelo menos dois pontos, para mim essenciais: Severus Snape, figura crucial a partir do sexto livro, e com um inimaginável e surpreendente papel neste último, é relegado novamente para a invisibilidade, aparecendo justamente por breves minutos; a descrença de Harry em Dumbledore e o consequente conflito interior entre a busca pelas Horcruxes e a demanda pelos Talismãs da Morte são pobremente desenvolvidos, perdendo-se, com estas duas fraquezas, muita da necessária intensidade e tensão para o culminar da narrativa.
Se o argumento peca por estas duas grandes falhas, a nível técnico, pelo contrário, o filme é irrepreensível! Efeitos especiais extraordinários e doseados, sem se sobreporem à história, e totalmente ofuscados pela melancólica, dramática, lúgubre e saturada fotografia, num belíssimo trabalho do “nosso” Eduardo Serra!
Em termos interpretativos, terei que destacar o magnífico trabalho de Emma Watson que domina todas as cenas, criando como nunca uma verdadeira Hermione, sensível, inteligente, destemida, perspicaz!
Nota final para a deslumbrante sequência do conto d’Os Três Irmãos, em inesperada animação, deveras hipnotizante!
“Harry Potter and The Deathly Hallows” conseguiu, nesta sua primeira parte, fascinar-me com a sua refrescante e adulta perspectiva, urgentemente necessária, fazendo esquecer a malfadada adaptação anterior! Apesar de algumas pontas soltas, aguardarei (ansiosamente) até Julho para dar o meu veredicto final!
Termino com o sincero desejo que a saga encerre em grande, numa homenagem épica à fabulosa e inesquecível obra de J.K. Rowling!